Há coincidências. Algumas mais significativas que outras, é certo. Podia começar exatamente por aqui, quando há uns anos atrás, integrada no grupo coordenador da Formação de Leigos, me cruzei com esta frase de Jean Gailhac: “A árvore será o que receber das suas raízes!” É essa a génese do que somos e do que queremos ser. Que raízes são estas que me sustentam? Em que árvore me tornei? Persistente nas convicções e na fé; caduca porque sei que a cada dia posso renovar a minha esperança, em mim e na vida.
Corre em mim uma paixão incomensurável pela História, pela vida e marca de todos aqueles que nos antecederam e que marcaram indelevelmente a nossa identidade coletiva. Sou portuguesa, numa mistura generosa de sangue nortenho e do centro da nação. Sou um exemplar de tantos outros lusitanos. Porque, no fundo, somos uma miscelânea nobre de povos, etnias e culturas como presságio daquilo que fizemos uns séculos após o nascimento da nacionalidade, quando nos aventurámos nas descobertas e conquistámos um mundo novo, quebrando uma série de mitos fantásticos sobre um mundo irreal e imaginado. Um povo que soube ser pontífice, não no contexto sagrado da palavra, mas no sentido estrito dos que cuidam de pontes. Um povo que conseguiu unificar as várias culturas com quem contactou, bebendo de cada uma delas conhecimento, dando vida à palavra aculturação e deixando um enorme contributo para a Humanidade, da qual somos todos herdeiros.
De inegável valor histórico e cultural, os testemunhos materiais e imateriais desse passado que evoca os primórdios da globalização, mostram-nos a ousadia e coragem dos homens de então, que levaram além fronteiras a mensagem de Cristo e a nobre língua portuguesa.
É esse espólio cultural e artístico, desta época e de todos os tempos históricos, que devemos preservar como parte integrante daquilo que somos.
No momento em que celebramos o Dia Internacional dos Monumentos e Sítios urge olhar para o património histórico como um bem comum, salvaguardando-o para as gerações futuras, com toda a riqueza e autenticidade.
Como testemunho vivo de tradições ancestrais, que nos permitem perpetuar na história e na vida, o património ergue-se para marcar o tempo, não um tempo vago e sem sentido, mas o tempo. Como forma de eternizar aquele momento em que os homens se uniram para construir a catedral, o castelo, a muralha, a estátua...quando se uniram para fazer História.
Somos da terra da fé. Aprendemos a amarmo-nos como irmãos e a estender o braço a quem precisa de nós. Mosteiros e conventos, entre muros de pedras e claustros, servem como testemunhas silenciosas dessa devoção e fé.
Somos da terra da saudade. Aprendemos, desde cedo, a ouvir o fado como identidade nostálgica daquilo que vivemos ou gostaríamos de ter vivido. Imponentes cidades, com os seus casarios coloridos e ruelas animadas, ergueram-se entre pedras da calçada e candelabros como símbolo vivo da riqueza de fazer nascer os sonhos.
Somos da terra da alegria cantada, do sonho sussurrado, da bravura declarada.
Por tudo isso, é responsabilidade comum salvaguardar o património da humanidade para todos aqueles que nos irão suceder.
A sua preservação visa proteger tanto a obra artística em si como o testemunho da nossa história. E todos, “TODOS podemos colaborar, como instrumentos de Deus, no cuidado da criação, cada um a partir da sua cultura, experiência, iniciativas e capacidades”, tal como nos pede o Papa Francisco. A nossa identidade, a nossa memória, a nossa passagem terrena tem uma história, tem uma marca. Somos património!
E porque somos todos braços da mesma árvore, saibamos viver esta humanidade que nos une, preservando aquilo que nos sustém e que nos perpetua.
Eliana Oliveira
Professora