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E DEPOIS DO ADEUS ÀS FÉRIAS?

Férias não são uma possibilidade para todos e não há só férias no Verão.

Ainda assim, o final do mês de agosto assinala, a muitos de nós, a transição de um tempo de férias para o despontar de um novo tempo. Talvez reconheçamos que neste Verão cedemos à falsa promessa de umas ‘férias de sonho’ que mais não foram que corridas frenéticas de um lugar a outro ou de programa para programa, num passar desassossegado pelas coisas, num consumismo excessivo de sensações, emoções ou produtos. Bem diferentes terão sido as nossas férias se as vivemos como um abrandamento, como tempo de reencontros e conversas desapressadas com familiares e amigos, de leitura de um bom livro, de passeio à beira-mar, de contemplação de um pôr-do-sol ou de uma bela obra de arte, ou de mergulho no nosso interior.

Sabemos o que é o cansaço depois de um projeto concluído, de planos e metas cumpridos, de um ano de trabalho. Ou o cansaço que sentimos quando nos afastamos do essencial e do que realmente tem valor na vida. Todos precisamos de férias para repor as energias, recuperar um significado maior, deliciar-se com a vida.

Talvez precisemos não apenas de férias, mas de aprender a incorporar o descanso na nossa rotina.

Tempo para fazer e tempo para abster-se de fazer (Cf. Ecl. 3), a fim de encontrar ritmos mais equilibrados e humanizadores. O P. Jean Gailhac poderia dizer-nos hoje o que, sabiamente, escreveu a uma Irmã, em agosto de 1878: «Descanse... Alimente-se bem, pois tem um grande trabalho à sua frente. Contentemo-nos com as obras que Deus nos confiou e procuremos consolidá-las e fortalece-las. Há um velho provérbio que diz: “Quem muito abarca pouco aperta”.»

Descansar é vital! Criados à imagem e semelhança de Deus, somos criados para descansar como Deus que descansa no ‘sétimo dia’. De acordo com a primeira narrativa da criação contida no livro do Génesis, Deus, depois de finalizar a sua obra e ver que tudo era muito bom, no ‘sétimo dia’ descansou. «Depois do esforço vem o justo descanso. Um direito também para o próprio Deus.», faz notar a teóloga Marinella Perroni. Como seria se reservássemos parte do nosso tempo para ser este ‘sétimo dia’ dedicado a contemplar o realizado, a ver o bom e belo?

É tão importante saber descansar! Precisamos, porventura, de aprender como descansar.

Nem sempre é fácil encontrar o que verdadeiramente nos descansa. Descansar requer sabedoria.

Há uma passagem do Evangelho de Marcos (6, 30-31) que me deixa a pensar: «Naquele tempo, os apóstolos voltaram para junto de Jesus e contaram-Lhe tudo o que tinham feito e ensinado. Então Jesus disse-lhes: “Vinde comigo para um lugar isolado e descansai um pouco”.» Aos apóstolos, que regressam do trabalho da missão e contam com entusiasmo tudo o que fizeram, Jesus convida a descansar. Não se alonga em perguntas ou em elogios pelo êxito dos feitos. Ele convida os seus a descansar, à parte, com Ele.
Tal como com os apóstolos, Jesus preocupa-se com o nosso cansaço e assegura-nos que n’Ele encontraremos descanso: «Vinde a Mim todos os que andais cansados e oprimidos, e Eu vos aliviarei...» (Mt 11, 28). É interessante notar que o descanso cristão não é um analgésico momentâneo, um espaço de alienação, uma fuga de nós ou de outros. O que verdadeiramente nos descansa é uma relação!

E depois do adeus às férias?

«Precisamos de umaecologia do coração’, que seja feita de descanso, contemplação e compaixão», aconselha o Papa Francisco. Se aprendermos a descansar verdadeiramente, tornar-nos-emos capazes de verdadeira compaixão. Se cultivarmos um olhar contemplativo, continuaremos as nossas atividades sem a atitude voraz de quem quer possuir e consumir tudo. Só o coração que não se deixa levar pela pressa é capaz de se comover, isto é, não se deixar subjugar pelas coisas a fazer e compreender os outros, as suas feridas e necessidades.

Parar. Ficar em silêncio. Escutar a própria consciência. Deixar que Deus nos fale ao coração. Na oração que nos une ao Pai no Espírito, encontraremos o sentido da nossa existência no mundo, vislumbraremos o horizonte maior, aprenderemos a esperar contra toda a esperança, pois entraremos de modo profundo numa história habitada e projetada para o amor.

Parar. Ficar em silêncio. Contemplar. Não como quem se fecha em si próprio, mas como quem se centra. Não para nos isentar das pessoas e dos acontecimentos à nossa volta, senão justamente para reconhecer Deus neles. A intimidade amorosa com Deus encorajar-nos-á ao compromisso renovado com a Sua causa, capacitar-nos-á para servir e dar a própria vida. Uma e outra vez, enviar-nos-á a viver ao estilo de Jesus: desde Deus, para os outros.

Ir Ana Luísa Pinto, rscm