Num planeta em que as tensões aumentam e as diferenças são exploradas para criar divisões na humanidade, “Turismo e Paz” foi o tema escolhido este ano para marcar o Dia Mundial do Turismo, celebrado a 27 de setembro. As viagens e as práticas turísticas sustentáveis podem promover maior harmonia e têm o potencial de aumentar a tolerância entre os povos. Ao cruzarmos fronteiras, experimentarmos costumes, línguas e formas de viver diferentes das que conhecemos com respeito, percebemos que, mais do que diferenças superficiais, existem aspetos universais que nos unem - a busca por felicidade, amor, segurança, a necessidade de saúde e convivência pacífica... Vemos noutras famílias, a nossa família. Começamos a cultivar uma verdadeira empatia, quando desconstruímos estereótipos e narrativas simplistas, artificiais ou até preconceituosas, construídas por influência dos meios de comunicação social ou por desconhecimento. As diferenças culturais assumem-se como expressões de diversidade e ensinam-nos a ser mais flexíveis e abertos. No intercâmbio cultural somos, todos, turistas e locais, promessa viva de diálogo e paz.
Quando abraçamos a nossa alma de viajantes, em algum momento da aventura reconheceremos que somos mais do que turistas em passeio. Saberemos que a nossa pegada deixará marcas.
E se deixarmos que a viagem também nos marque?
E se escolhermos o turismo interior? Ver em cada rosto o divino, em cada lugar, um espaço sagrado?
Como dizia o poeta místico Daniel Faria: "... Cada um é um lugar para os outros."
- Como pessoas, que lugar temos sido uns para os outros? Acolhemos? Somos acolhidos?
- Ajudamos? Permitimos que nos ajudem? Aceitamos errar? Apontamos o dedo carregado de crítica e julgamento ou damos a mão?
- Somos um lugar de verdade e de compaixão para os outros? Quando estamos vulneráveis, o que fazemos? Partilhamos as nossas alegrias e tristezas? As nossas frustrações e sonhos? Vivemos com ética e responsabilidade?
Questionar, partindo de dentro para fora é querer trilhar uma rota construtiva.
A vulnerabilidade não é fraqueza. É a maior medida de coragem (Brené Brown). Permite que nos conectemos uns aos outros de forma genuína. Tal como a espiritualidade nos transcende e oferece uma conexão com algo mais profundo do que nós mesmos.
A fuga, a evasão, a busca constante e frenética de respostas no mundo externo mantém-nos iludidos ou distantes do essencial. Quando embarcamos numa jornada de introspeção, abrimos a porta do "turismo interior", para explorar as paisagens da alma, as profundezas da nossa mente, memórias e emoções. E com isso, desenvolvemos maior clareza sobre os nossos valores, crenças, expectativas, necessidades e motivações. Identificamos os nossos pontos fortes e áreas a desenvolver. Ganhamos consciência dos padrões emocionais e comportamentais que nos condicionam. Criamos espaço para a cura, para lidar melhor com os desafios pessoais e os conflitos internos. Gera-se em nós uma sensação renovada de propósito de vida.
Pode ser magnífica e assustadora a viagem do autoconhecimento… Mas como dizia o psicólogo Carl Jung - Quem olha para fora, sonha; quem olha para dentro, desperta.
Visitar e permanecer algum tempo pelos cantinhos recônditos da nossa alma é encontrar lugares de sol e de escuridão. A luz simboliza a consciência, o bem, a clareza e o lado positivo da vida, enquanto a sombra se refere aos aspetos inconscientes, reprimidos ou desconhecidos, muitas vezes ligados a medos, inseguranças ou traços indesejados, reprimidos e ignorados da nossa personalidade, por serem considerados moralmente inaceitáveis pela sociedade ou simplesmente por não se encaixarem na imagem que criamos de nós mesmos. Esses aspetos sombrios, quando não reconhecidos, tendem a manifestar-se de formas prejudiciais, projetando-se sobre outras pessoas ou situações. A luz, por outro lado, é frequentemente associada ao consciente, ao que está à vista, representando os aspetos positivos da personalidade que são reconhecidos e aceites. Só quando reconhecemos as nossas sombras e compreendemos o que está oculto, podemos viver de modo mais equilibrado, consciente, autêntico.
A geografia da alma vale a pena.
Explorar o inóspito, atravessar vales e desertos, sentar em silêncio para escutar a melodia que faz bater o nosso coração. Transformar os lugares interiores em espaços cuidados com amor, para que possam ser habitados e visitados sem culpa, vergonha ou mágoas. Seja pela oração, com psicoterapia, journaling, meditação ou percorrendo outro caminho que nos faça sentido.
Nenhuma alma é pequena. Há beleza, história, aprendizagem, futuro e potencial em cada um. O turismo interior é uma viagem contínua, dinâmica e preci(o)sa! Vale cada minuto que lhe dedicamos!
Elisabete Marques
Psicóloga